quarta-feira, 29 de agosto de 2012

RELIGIÃO E ESTADO


Batismo de Clovis, Rei dos Francos
"No Império brasileiro, respeitando o fato de a imensa maioria da população brasileira ser católica, a Religião Católica era oficialmente a religião de Estado. 
Agora, pergunta-se, deve ser assim ou não deve ser assim?
Pela doutrina católica, que é professada pela imensa maioria dos brasileiros-e pelos princípios democráticos a legislação não deve ofender as consciências da maioria-o Estado, em princípio, deve ser unido á Igreja. Entretanto, no caso concreto atual, dadas as circunstâncias do Brasil, seria impensável essa união. Inclusive por uma razão:é que o Estado está em crise, mas a Igreja está, infelizmente, numa crise ainda muito pior, e unir a Igreja ao Estado, hoje em dia, seria fazer com que se multiplicassem as as duas crises, seria quase um suicídio. De maneira que na monarquia de 1993 * o problema nem se põe: uma união da Igreja e do Estado seria impensável sem toda uma reforma a começar pela Igreja."**

O documento intitulado "Linhas gerais da organização política da Monarquia brasileira no limiar do Terceiro Milênio da Era Cristã- uma proposta da Juventude Monárquica do Brasil", aprovado em Assembléia geral extraordinária da Juventude Monárquica, em 5 de novembro de 1988, apresenta a questão de forma sucinta e clara:
"8. Uma forma de união da Igreja e do Estado, em princípio desejável, não deveria ser feita antes de amplas tratativas e eventual concordata com a Santa Sé, a fim de garantir ao novo Império brasileiro que não fosse afetado pela profunda crise hoje infelizmente generalizada nos meios católicos".



* Referência ao plebiscito para que o povo viesse a definir a forma e o sistema de governo do Brasil.
**Armando Alexandre dos Santos. Ser ou não ser MONARQUISTA - Eis a questão! São Paulo. Artpress. 1990. 158 pp. Citação: P.99.

quarta-feira, 22 de agosto de 2012

LEÃO XIII E DONA ISABEL




Muitos dos dons conferidos pelos papas a soberanos decorrem de uma relação histórica construída com o passar dos séculos. Nosso império teve vida curta, mas mesmo assim a Princesa Imperial Regente, D Isabel, Chefe da Casa Imperial do Brasil, de 1891 a 1921, recebeu de Sua Santidade o Papa Leão XIII, a 28 de setembro de 1888, a primeira Rosa de Ouro do Brasil. Foi orador na ocasião D. Antônio de Macedo Costa, o companheiro de D. Vital. Essa Rosa de Ouro foi doada ao Museu de Arte Sacra do Rio de Janeiro, que funciona no subsolo da Catedral Arquidiocesana, por seu neto e sucessor imediato, o Príncipe Dom Pedro Henrique, Chefe da Casa Imperial do Brasil de 1921 a 1981 e pai do atual Chefe da Casa, o Príncipe Dom Luiz.

terça-feira, 21 de agosto de 2012

FOTO DA SEMANA

S.A.I.R Dom Rafael e Dona Amélia recebendo o Rei dos Reis e Nosso Senhor, Jesus Cristo, das mãos do Padre Anderson Battista

domingo, 19 de agosto de 2012

COMO A SANTA COROA PAROU NAS MÃOS COMUNISTAS


Desde 1945, com anuência do Parlamento Europeu e do Arquiduque Otto de Habsburgo a Santa Coroa foi colocada no Forte Knox, mesmo lugar onde é guardado o tesouro americano, para assim ficar protegida do governo comunista que tomara conta do Estado Húngaro, não podendo ser retirada senão com permissão do Sumo Pontífice, do presidente dos Estados Unidos e do Arquiduque da Áustria.

Ocorreu que na mesma época em que, para escapar da prisão e maus tratos dos inimigos da religião, o Cardeal Midzensty se refugiara na embaixada dos EUA na Hungria, o papa Paulo VI com apoio do presidente James (Jimmy) Carter, e contra a vontade do Arquiduque Otto, retiraram a Santa Coroa do Forte Knox e a entregaram ao governo comunista que veementemente a reivindicara por anos.

Em 5 de janeiro de 1978 a posse da coroa foi finalmente transferida para o governo da Hungria. Ato lamentável que se equipara à entrega simbólica da Igreja e do Estado húngaro às mãos do Partido Comunista e que da parte do esquerdista Jimmy Carter se explica, mas que indispôs o cardeal Midzensty e o Arquiduque Otto com o papa Paulo VI, conjuntamente com o povo húngaro que viu seu tesouro mais sagrado e precioso ser trasladado para a posse dos tiranos.

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

UNIÃO AMIGA ENTRE O TRONO E O ALTAR


União amiga entre o Trono e o Altar


Discurso pronunciado por D. Antônio Macedo Costa, companheiro de D. Vital, e com ele preso por ordem do gabinete chefiado pelo Visconde do Rio Branco. Anos depois, em 28 de setembro de 1888,em homenagem a Princesa Isabel, por ocasião da entrega da Rosa de Ouro, oferecida à princesa pelo Papa Leão XIII, D. Antônio pronuncia famoso discurso, no qual se destaca esse trecho, verdadeiro programa para o novo reinado.

"Abolimos o cativeiro material. Foi muito; mas isto foi apenas o começo; removemos um estorvo e nada mais. Cumpre agora abolir o cativeiro moral: é necessário resgatar as almas de tudo o que é baixo, vergonhoso, degradante. Restaurar moral e religiosamente o Brasil! Esta é a obra das obras; a obra essencial, a obra fundamental sobre que repousa a estabilidade do trono e o futuro da nossa nacionalidade. Senhores, nós atravessamos uma hora perturbada e cheia de tristezas: assistimos a desfalecimentos deploráveis, a uma tendência para derruir as tradições do passado sob o pretexto de preparar mais auspicioso porvir... Há uma cousa que permanece, uma cousa firme, constante, que vigora, que tem vida, com que se pode contar para o futuro: é a religião de Jesus Cristo, ensinada pela Igreja Católica há dezoito séculos, com a assistência do Espírito do mesmo Cristo. Aí está a força que restaura, aí está a força que salva, que adianta seguramente os povos nos caminhos do verdadeiro progresso - o que tem por ponto de partida o Evangelho... A força material da autoridade pública apenas atinge o corpo, - quando atinge! É preciso uma força superior, sobrenatural, que penetre até às almas, que chegue até o fundo das consciências para lá depor os germens fecundos da honra e da virtude. Pois bem, Senhores, já que o Sumo Pontífice, o maior representante da Religião, o homem que exerce a maior força moral neste mundo, em uma crise tão memorável da nossa vida social vem a nós, cheio de benevolência e amor pela nossa Nação, vamos nós ao Sumo Pontífice ! Estreitemos com ele laços de amor, de gratidão, de filial obediência."

terça-feira, 14 de agosto de 2012

A PRINCESA DO BRASIL E A RAINHA DO CÉU



Em 1868 estiveram em Aparecida, a Princesa Imperial D. Isabel e seu esposo, o Conde d'Eu. Em 1884 lá voltaram ambos, acompanhados dos seus três filhos, D. Pedro de Alcântara, D. Luiz e D. Antonio. A Princesa ofereceu a Nossa Senhora, na ocasião, uma coroa de ouro cravejada de 40 brilhantes. Essa mesma coroa serviria, a 8 de setembro de 1904, para a coroação solene da Imagem, efetuada por mandado do Papa São Pio X.(1)
Em suas visitas, D. Isabel seguia os passos de seu avô, D. Pedro I, o Fundador da Nacionalidade Brasileira, que lá estivera rezando no dia 22 de agosto de 1822, 16 dias antes da Independência do Brasil, prometendo consagrar o Brasil a Nossa Senhora da Conceição, caso chegasse a bom termo a crise política que então se verificava. (2). Recentemente, em cerimônia amplamente divulgada pela Rede Vida de televisão, procedeu-se a uma nova coroação da Imagem. Portava a Coroa a Princesa D. Isabel, trineta de D. Isabel, sobrinha de D. Luiz, Chefe da Casa Imperial do Brasil, hoje casada com o Conde Alexandre de Stolberg-Stolberg, de família mediatizada, considerada igual às famílias reinantes.

A passagem da Princesa Isabel em Aparecida
Conceição Borges Ribeiro Camargo


A história de Aparecida do Norte é cheia de poesia, e beleza e o passado enfeita o presente, emoldurando com a luz da Fé e do Amor. Trazemos hoje uma página, onde os fatos se encadeiam como elos de uma corrente de ouro guardando a cidade.
“Entre os inúmeros devotos de Nossa Senhora Aparecida, crentes de seu poder de sua magnanimidade, que se ajoelharam aos seus pés, conta-se que esteve o próprio Dom Pedro, quando de sua viagem a São Paulo, em 1822. Afirma-se que ele aqui estivera, fizera as suas preces e com estas o voto de proclamar Nossa Senhora Aparecida Padroeira do Brasil, se corressem à feição os acontecimentos de São Paulo. É bem de assinalar que a proclamação oficial da Independência do Brasil teve exatamente a data de 8 de setembro de 1822, dia de Nossa Senhora. Independentemente de decretos oficiais já hoje ninguém poderá contestar que lhe cabe de direito o título de Padroeira do Brasil, conferido pelo coração da grande maioria dos brasileiros. Qualquer ato governamental seria apenas sanção para o decreto da alma brasileira”. (do discurso do Dr. Wenceslau Braz)
As romarias constituem o aspecto lindo e sentimental do culto a Nossa Senhora Aparecida. Em Aparecida o culto é lírico, místico e cheio de Fé. Romarias cantantes em grupos alegres. Iniciaram-se com a nova dos milagres de Nossa Senhora surgida no rio Paraíba em outubro de 1717 e ecoaram pelas serranias as graças que Ela concedia. E começaram a afluir romarias; poucos peregrinos e depois a pé, a cavalo em tropas, em carros de boi e romarias com sacerdotes, magistrados, Imperador, Altezas Imperiais, religiosos, militares, etc. A Princesa Imperial Dona Isabel esteve visitando Nossa Senhora Aparecida. Temos, por meio de documentos, duas datas, duas visitas da Princesa Isabel à Nossa Senhora Aparecida.
Em “Excursão à Província de São Paulo” de Isabel Condessa d’Eu, há efemérides das viagens do Conde d’Eu na Província de São Paulo. E anotamos: 
1868.
“Regressando com a Princesa Imperial Da. Isabel, de Águas Virtuosas de Campanha, em Minas Gerais, onde foram fazer uso das águas, visitam, a 8 de dezembro, após etapas em vilas paulistas, a então Capela da milagrosa Nossa Senhora da Aparecida, feita padroeira do Império por D,. Pedro I. A 1º de janeiro de 1869, os Condes d’Eu regressam à Corte passando por Taubaté, Pindamonhangaba e Guaratinguetá.”
A passagem por Guaratinguetá de Suas Altezas Dona Isabel e o Conde d’Eu, no dia 7 de dezembro de 1868, está no livro 12 de Vereanças, folha 15 da Câmara dessa cidade, onde o Visconde de Guaratinguetá, Francisco de Assis e Oliveira Borges, comunicava em sessão realizada no dia 3 de novembro: - tem de passar por esta cidade na primeira quinzena do próximo futuro mês Suas Altezas e a Sereníssima Princesa Imperial e seu Augusto Esposo Conde d’Eu – e na comunicação, todas as providências pelo faustoso acontecimento, inclusive “oficiar ao Reverendíssimo Vigário e o mestre da Capela, para celebrar um “Te Deum laudamus” no dia da chegada e afixar o Edital convidando o povo e também pedindo orçamento provincial para a feitura da ponte e estrada até a Capela”...
Ficou encarregado de fazer a estrada, Antônio Eleutério Aguiar das Rosas sob a administração do Padre Benedito Teixeira da Silva Pinto.
No “Santuário de Aparecida”, de 10 de dezembro de 1921, encontramos: - Dona Isabel, devota de Nossa Senhora Aparecida.
“Corria o ano de 1868, quando dois ilustres romeiros vieram visitar a Capela de Nossa Senhora da Conceição Aparecida. A velha Capela, situada no alto do pitoresco Morro  dos Coqueiros, revestiu-se de uma nova pintura, começada em 20 de julho de 1867, terminada em 2 de  novembro de 1868, para a qual foram gastos cinco contos e duzentos mil réis. Servia de Capelão o muito estimado Padre Antonio Leite Godói, a quem sucedeu no mesmo cargo o distinto Padre Guido Antônio de Paula e Silva, a 20 de novembro de 1868.  Prestava os serviços de sacristão o senhor Anastácio Pinto Soares. Ocupava o cargo de tesoureiro o Reverendíssimo Padre Antônio Luiz dos Reis França. Costumava-se celebrar com muita pompa a então única festa de Nossa Senhora, no dia 8 de dezembro.

__________________
1) Cfr. Pe. Júlio Brustoloni, C.SS.R., " A Senhora da Conceição Aparecida", Editora Santuário, Aparecida, 1979, p.115.
2) Cfr. Côn. João Corrêa Machado, " Aparecida na História e na Literatura, Campinas, 1983, pp. 248-259.

domingo, 12 de agosto de 2012

CARTA DO CONDE D'EU


Sr. Dr. Armando Dias de Azevedo.

Sinto não ter podido, há tempo já, escrever-lhe. A SEPARAÇÃO DE MINHA DELICADA COMPANHEIRA DE MAIS DE 57 ANOS DEIXOU-ME MUITO ABATIDO, e, ultimamente, acresceram sufocações cardíacas, que provavelmente me privarão, com grande desgosto meu, de realizar meu projeto de ir ao Rio tomar parte na celebração do centenário da Independência Pátria. A alteração da minha letra, mostra-lhe o declinar de minhas forças, e a dificuldade que tenho em escrever. Deve fazer ideia quanto nos penhoram as demonstrações havidas nessa capital por motivo do nosso irreparável infortúnio: a inserção, por proposta sua, dum voto de pesar, na sessão do Instituto Histórico, e as diversas Missas rezadas. Queira receber meus sentidos agradecimentos e transmiti-los aos Srs. Cônego Balen, Olímpio Duarte, Nicolau Birnefeld Filho, que bem conheço por sua atenciosa correspondência,os quais, com o senhor obsequiosamente promoveram a Missa de 7º Dia agradecendo também as exéquias solenes a que se dignou presidir o Reverendíssimo Arcebispo Metropolitano....

Gastão de Orléans,

Castelo D'Eu, 24 de julho de 1922.

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

CAÇADORES DE UNICÓRNIO - III

II) Mesmo corrompida e apesar da corrupção do monarca, preferível, conquanto mal menor

Coroa de Eugênia, Imperatriz Consorte da França
Eis-nos novamente aqui para trazer aos leitores mais um artigo desta série que pretende ser uma breve réplica, e um pequeno esclarecimento, de questões que ultimamente se fizeram em voga pelas acusações que sofreram nossos príncipes. Não pretende é lógico esgotar o tema e ser completamente definitiva.
Tratamos já no primeiro artigo sobre a autoridade de Santo Tomás e sobre a necessidade de crer, ou ao menos consentir, que a monarquia seja a melhor forma de governo, não tratamos ainda se é errado admitir outra forma de governo como legítima. Trataremos antes da questão levantada pelos acusadores, que é a questão de haver mal menor em política, ou seja, se entre duas opções más, possamos escolher a que acarreta menos males, seja a de um candidato à postos de governo, seja quanto à forma de governo, ou forma de Estado em si. Ora, dizem eles que um mal menor é sempre mal, e portanto seria imoral escolhê-lo.
Devo, no entanto, notar que toda ufania psitacídea com a qual eles dizem ser meros repetidores de Santo Tomás se acaba aqui. Explico. Chama-se Mestre Principal o que possui a ciência perfeita, nos dando a conhecer a verdade pela evidência e pela demonstração, e também é claro, pelo peso de sua própria autoridade. Assim sendo, um mero repetidor não tem autoridade própria, não pode atrever-se a interpretar ou desenvolver a doutrina do mestre principal, já um Mestre Auxiliar, participa, ainda que imperfeitamente da ciência e doutrina do Mestre Principal e pode, portanto, interpretar e desenvolver até certo grau, dependente e participado e até impor certas sentenças pelo peso da própria autoridade. Assim, em filosofia, Santo Tomás é um mestre principal, já Suarez ou Cayetano são mestres auxiliares. (1) Nossos adversários se pretendem repetidores, mas ao soltar a tremenda asneira sobre a inexistência de mal menor em política, desviam-se daquele que pretendem repetir, e impõe por autoridade própria (o que não têm) uma opinião pessoal, disfarçando-se assim em mestres auxiliares.
Mas vamos diretamente ao ponto, já que ao acusador cabe o ônus da prova, e repitamos aqui o que nos disse realmente Santo Tomás em o Governo do Príncipe:

“Assim, porém, como é ótimo o regime do rei, também é péssimo o governo do tirano. Opõe-se à politia a democracia, sendo ambas, como do exposto se patenteia, governo que por muitos se exerce; à aristocracia a oligarquia, exercendo-se ambas por poucos; e o reino à tirania, exercendo-os ambos um só. Que, porém, é o reino o melhor regime, mostrou-se antes. Se, pois, ao ótimo se opõe o péssimo, força é que a tirania seja o pior. Além disso: a virtude unida é mais eficaz para realizar o efeito, do que a dispersa ou dividida. Em verdade, muitos simultaneamente congregados arrastam o que divididamente por partes não poderia ser arrastado por cada um isoladamente. Assim como é mais útil seja o mais possivelmente una a virtude que opera para o bem, a fim de ser mais poderosa para a sua operação, da mesma forma é ela mais nociva do que dividida, se, una, opera o mal. Opera em dano da multidão a força dum chefe injusto, quando desvia somente para seu próprio bem o bem comum da multidão. Conseqüentemente, assim como, num governo justo, tanto mais útil é ele, quanto mais una for a chefia, de sorte que é o reino melhor que a aristocracia e esta que a politia; também, ao inverso, se dará no governo injusto, que, quanto mais una for a chefia, tanto mais nocivo há de ele ser. Assim, mais nociva é a tirania que a oligarquia, e esta do que a democracia.
Mais: o que faz injusto um governo é o tratar-se, nele, do bem particular do governante, com menosprezo do bem comum da multidão. Logo, quanto mais se afasta do bem comum, tanto mais injusto é o regime; ora, mais se afasta do bem comum a oligarquia, na qual se busca o bem de uns poucos, do que na democracia, na qual se procura o de muitos; e ainda mais se aparta do bem comum na tirania, em que se busca somente o bem de um; porquanto da totalidade é mais próximo o muito que o pouco, e o pouco que um só. É, pois, o governo do tirano o mais injusto. Semelhantemente se tornará evidente a quem considerar a ordem da divina providência, que tudo dispõe pelo melhor. Pois, nas coisas, o bem provém duma única causa perfeita, congregando-se tudo aquilo que pode coadjuvar ao bem, enquanto o mal, em particular, provém dos defeitos particulares. Assim, não há beleza no corpo, a não ser que todos os membros estejam dispostos convenientemente; apresente-se inconvenientemente qualquer membro, e ter-se-á a feiura  E assim é que, por modos vários, procede a feiura de muitas causas, enquanto a beleza por um só modo e de uma só causa perfeita. E assim se dá com todos os bens e males, como que por providência de Deus, a fim de que o bem proveniente de uma só causa seja mais forte, entretanto, o mal, proveniente de muitas causas, seja mais fraco. Releva, pois, que o governo justo seja de um só, para ser mais forte. Porque, caso se afaste da justiça, mais convém seja de muitos, que entre si se atrapalhem, para ser mais fraco. Entre os regimes injustos é, portanto, o mais suportável a democracia, e o pior, a tirania.
Isso se evidencia sobremaneira, considerando-se os males que dos tiranos provêm, visto como, quando o tirano, desprezando o bem comum, vai no encalço do particular, segue-se que agrave de muitas formas os súditos, conforme as diversas paixões que o dominem, levando a cobiçar determinados bens. O que é possuído da paixão da cupidez rouba os bens dos súditos; daí Salomão (Pr 29, 4): “O rei justo eleva sua terra; destrói-a o homem avaro”. Se, porém, o subjuga a paixão da ira, por nada derrama sangue, donde o ser dito por Ezequiel (22, 27): “Os seus príncipes são, no seu meio, como lobos que arrebatam a presa para derramar sangue”. Por isso admoesta o sábio (Eclo. 9, 18) que se deve fugir de tal regime, dizendo: “Fica longe do homem que tem o poder de matar”; visto que não por justiça, senão pela força, mata por desregramento da vontade. Dessa forma, nenhuma segurança haverá, senão que serão incertas todas as coisas, uma vez que se afasta o direito, não podendo haver firmeza no que quer que seja, desregramento estranho. Nem se fazem agravos aos súditos só nas coisas corporais, mas ainda se lhes impedem as espirituais, já que o que prefere mandar a beneficiar impede todo o proveito dos súditos, suspeitando ser prejuízo ao seu domínio iníquo toda excelência dos súditos. Porque aos tiranos são mais suspeitos os bons que os maus, e sempre lhes é de temer a alheia virtude. Eis a razão pela qual pretendem os ditos tiranos que os seus súditos não se tornem virtuosos nem adquiram o espírito de magnanimidade que lhes faça intolerável a sua iníqua dominação. Pretendem também que não se firme entre os súditos a aliança da amizade e gozem reciprocamente do benefício da paz, de modo que, não confiando um no outro, nada possam tramar contra o senhorio deles. Com esse fim, semeiam discórdias entre os súditos, alimentam-nas, se nascem, proíbem o que promove o entendimento entre os homens, como conúbios, festins e outras coisas do gênero, pelas quais costuma gerar-se a familiaridade e a confiança entre eles. Diligenciam, outrossim, para que não se façam poderosos ou ricos, porquanto, suspeitando dos súditos segundo a consciência da sua própria malícia, assim como eles, tiranos, usam do seu poder e riquezas para prejudicar, igualmente temem que poder e riquezas dos súditos se lhes tornem nocivos. Daí o dizer-se do tirano também em Jó (15,21): “O ruído do terror lhe está sempre ao ouvido, e, embora haja paz (isto é, sem ninguém intentar mal contra ele), sempre imagina ciladas”.
Resulta disso que – quando os dirigentes, que deveriam induzir os súditos às virtudes, nefandamente lhas detestam e vedam-nas o quanto podem – poucos virtuosos há sob os tiranos. Pois, segundo a sentença de Aristóteles (Ética a Nicômaco, I, 3, 1095 b 28-30), os varões fortes encontram-se junto daqueles que honram os mais fortes, e diz Túlio (Cícero, Tusculanas, I, 2; cf. Agostinho, Cidade de Deus, V, 13): “Ficam sempre rasteiras e pouco vigoram as coisas que todos rebaixam”. É também natural degenerem para um caráter servil e se façam pusilânimes para toda obra viril e esforçada homens educados sob o temor: o que experimentalmente se manifesta nos países que por muito tempo estiveram sob um tirano. Por isso é que diz o Apóstolo (Col 3,21): “Pais, não posto estar à mercê duma vontade estranha, para não dizer do provoqueis à indignação vossos filhos, para que não se tornem mesquinhos de ânimo”. E Salomão (Pr 23,12), considerando esses danos provenientes da tirania, diz: “Reinando os ímpios, fazem-se ruínas de homens”, pois que, pela maldade dos tiranos, os governados desfalecem na perfeição das virtudes; e volta a dizer (Ibid. 29,2): “Quando os ímpios assumem o governo, geme o povo como que reduzido à servidão”; e outra vez (28,28): “Quando se levantam dos ímpios, ocultam-se os
homens”, para fugirem à crueldade dos tiranos. Nem é para admirar, por isso, que nada difere da fera o homem que governa sem razão e sim segundo o desregramento da sua alma, razão de dizer Salomão (Pr 28,15): “Leão enfurecido e urso faminto é um príncipe ímpio sobre um povo pobre”, motivo por que dos tiranos se esconderem os homens como de feras cruéis, parecendo ser a mesma coisa submeter-se a um tirano que prostrar-se ante uma fera bravia.” (2)

Considerando então que uma monarquia liberal é equiparável à uma tirania, justamente porque não há tirano pior que um liberal, e que isso se dá justamente porque o liberalismo é um desvio do bem comum, ao mesmo tempo em que um monarca liberal ao invés de excitar os súditos à virtude, com seu exemplo vedam o acesso à ela, exatamente como disse acima Santo Tomás do tirano. Agora, resta saber o que é pior, uma monarquia corrompida, uma aristocracia corrompida, ou uma democracia (divergem os tradutores no termo, que nessa versão é politia), e se dentre tais regimes corruptos poderíamos escolher sem culpa o que é menos mal. Para isso vamos ao texto de Santo Tomás:

“Como, todavia, entre dois, dos quais, tanto de um como de outro, está iminente o perigo, FAZ-SE MISTER ESCOLHER; cumpre que, com muito mais preferência, SE ESCOLHA AQUELE DO QUAL DERIVA MENOR MAL. Ora, da MONARQUIA QUE EM TIRANIA SE CONVERTE, SEGUE-SE MENOR MAL DO QUE DO GOVERNO DE MUITOS NOBRES, AO SE CORROMPER. Verdadeiramente, a dissensão que, o mais das vezes, deriva do governo de muitos, contraria o bem da paz, que é o princípio na multidão social, bem esse que pela tirania não se perde, mas somente se impedem alguns dos bens dos homens particulares, salvo se há excesso de tirania, que se agrave contra toda a comunidade. Portanto, há de se decidir de preferência pelo governo de um só do que pelo de muitos, se bem que de ambos decorram perigos.
Mais ainda: parece se deva mais fugir daquilo de que, com mais freqüência, podem advir grandes perigos; ora, seguem-se do governo de muitos os maiores perigos da multidão, mais amiúde do que do governo de um só, porque mais vezes sucede decair da intenção do bem comum algum dos muitos, do que o governante único. Desvie-se, com efeito, da intenção do bem comum qualquer um dos muitos que presidem, e ameaça de perigo de dissensão a multidão dos súditos, porque, discordando os príncipes, segue-se em conseqüência a discórdia na multidão. E, se um só preside, olha, as mais das vezes, pelo bem comum; ou, se se apartar da intenção desse bem, não se segue imediatamente que pretenda a opressão total dos súditos, o que é o excesso da tirania e ocupa o grau máximo da malignidade do governo, como acima vai demonstrado. Por isso, são mais de evitar os perigos provenientes do governo de muitos, que os do governo de um só.
Além disso, não menos, senão muito mais freqüente é transformar-se em tirania o governo de muitos que o de um só. Em verdade, nascida a dissensão pelo governo múltiplo, amiúde sucede superar um aos mais e usurpar para si somente o domínio da multidão, o que claramente se pode ver no acontecido com o andar do tempo. Pois, terminou em tirania quase todo regime de muitos, como se patenteia maximamente na república romana, a qual, como tivesse sido longo tempo administrada por muitos magistrados, despertando muitos ódios, dissensões e guerras civis, veio a cair sob os mais cruéis tiranos. E, se alguém considerar diligentemente, em todo o mundo, os fatos passados e os que ora se dão, há de achar ter havido mais tiranos nas terras governadas por muitos, do que nas governadas por um só. Se, portanto, a realeza, que é o melhor governo de todos, pareça dever evitar-se por causa da tirania; e se a tirania costuma dar-se não menos, porém mais, no governo de muitos que no de um só, resta simplesmente ser de mais conveniência viver sob um rei, do que sob o governo de muitos.
Conclusão: que o governo de um só, absolutamente, é o melhor de que maneira deve a multidão haver-se a respeito dele, visto como se lhe deve tirar a ocasião de tiranizar e, ainda quando o faça, há de tolerar-se para evitar maior mal.”(3)

Para facilitar nosso entendimento nessa questão citemos também a Garrigou-Lagrange:

“‘Segue-se, diz Santo Tomás (cap. III), que a monarquia é o melhor dos governos’, o mais uno, o mais durável, aquele que é mais forte para promover o bem comum; ‘a monarquia, diz ele ibid., é melhor que o regime aristocrático, e este, melhor que a república’. A mesma doutrina é conservada na Suma Teológica onde é dito, Ia. q. 103 a. 3, sobre o governo do universo: ‘Optima gubernatio est quae fit per unum’. O melhor governo é o de um só. [...]
É verdade, como é dito na presente obra (Cap. III), que, em virtude do princípio *optimi corruptio pessima* [a corrupção do melhor é a pior], a tirania é pior do que a oligarquia (que é a degeneração do poder aristocrático), e a oligarquia é pior do que a democracia (que, na terminologia de Santo Tomás, é a alteração ou corrupção da república).
Os males da tirania não são menos bem notados (Cap. III), tanto na ordem espiritual como na ordem temporal: [...]
Santo Tomás acrescenta, no entanto (cap. V), que se o governo de um só, tornando-se tirânico, todavia não se encarniçar, sem medida alguma, contra a multidão inteira, ele é ainda preferível aos demais. O governo coletivo, a partir do momento em que a discórdia nele se introduz, transforma-se quiçá mais frequentemente, com efeito, em opressão. Donde resulta, portanto, que é mais vantajoso viver sob um rei. É o melhor regime. Reencontramos a mesma conclusão na Suma Contra os Gentios, livro IV, cap. 76, n° 4, a propósito do governo da Igreja.””(4)

Temos então, bem fundamentado e comprovado, que segundo Santo Tomás, em questão política, não existe imoralidade em escolher a opção da qual decorrem menos males, e que mesmo uma monarquia desviada de seus fins é preferível à outro regime também desviado de seus fins.


(1) R.P. ÁLVARO CALDERÓN, “La Lámpara bajo el celemín,” Rio Reconquista, Buenos Aires, 2009, pág. 63-64
(2) SANTO TOMÁS DE AQUINO, “Governo do Príncipe,” Lib. III, Cap. IV, 10-13
(3) SANTO TOMÁS DE AQUINO, "Governo do Príncipe,” Lib. III, Cap. VI, 15.16.
(4) GARRIGOU-LAGRANGE, Reginald, “Prefácio ao Governo do Príncipe”.

sábado, 4 de agosto de 2012

RITUAL DA "BENÇÃO E COROAÇÃO DO REI" (III)

S.M.I. Dom Pedro I, retratado conforme a tradição portuguesa com a coroa ao lado, já que esta era tratada como pertencente à Imaculada Conceição


ORAÇÃO DA MISSA

Antitistae Sagrans: OMNIPOTENS DEUS, ut fámulis tuus N. Rex noster, qui tua miseratione suscepit regni gubernacula, virtutum etiam omnium percipiat incrementa, quibus decenter ornatus, et vitiorum monstra deitare, et ad te, qui via, véritas et vita ES, gloriosus valeat pervenire. Per Dominum nostrum Jesus Christum Filium tuum, qui tecum vivit, tet regnat in unitate Spíritus Saancti Deus, per omnia saecula saeculorum.

Bispo Sagrante: PEDIMOS, Deus Onipotente, para que te servo N., nosso Rei, que por tua misericórdia recebeu o governo do reino, receba também o incremento de todas as virtudes, elas quais possa evitar os monstros dos vícios, e chegar glorioso a ti que é o caminho, a verdade e a vida. Por Nosso Senhor Jesus Cristo...

Antitistae: Amen
Bispos: Amém.

O Rei recebe do Bispo a espada, é com ela cingido e, tirando-a da bainha, faz no ar alguns movimentos com ela e finge enxugá-la no braço esquerdo.

ENTREGA DA ESPADA

Antitistae Sagrans: ACCIPE gládium de altari sumptus per nostras manus, licet indignas, vic tamen, et auctoritate sanctorum Apostolorum consecratas, tibi regaliter concessum, nostraeque bene+dictionis oficio in defensionem sanctae Dei Ecclesiae divinus ordinatus; et memor esto ejus, de quo Psalmista prophetávit, dicens: Accingere gládio tuo super fêmur tuum potentissime; ut in hoc eumdem vim aequitatis exerceas, molem iniquitates potenter destruas, et sanctam Dei Eclesiam, ejusque fideles propugnes, ac protegas; Nec minus sub fide falsos, quam christiani nominis hostes execreris, ac dispergas; viuas, et pupillos clemente adjuves ac defendas; desolata restaurares, restaurata conserves; ulciscaris injusta, confirmes bene disposita; quatenus haec agendo, virtutum triumpho gloriosus, justitiaque cultor egregius, cum mundi Salatores sine fine regnare merearis.qui cum Deo Pater, et Spiritu Sancto vivit e rgnat Deus, per omnia saecula saeculorum.


Bispo Sagrante: TOMA a espada, tirado do altar por nossas mãos, embora indignas, porém sagradas, em nome e pela autoridade dos santos Apóstolos, espada concedida a ti como rei, e por vontade de Deus destinada por nossa bem+ção para a a defesa da Santa Igreja de Deus; e lembra-te daquilo que o profeta predisse: cinge tua espada e serás forte; para que por ela exerças a força da equidade, destruas vigorosamente a iniquidade, defendas e protejas a Santa Igreja de /Deus e seus fiéis; disperses os inimigos da fé e do nome cristão; ajudes e defendas viúvas e órfãos; restaures o que foi destruído e conserves o que foi restaurado; vingues injustiças, confirmes o bem; e assim mereças por estas ações, glorioso pelo triunfo das virtudes, um exímio cultor da justiça, reinar sem fim com o Salvador do mundo, que com Deus Pai e o Espírito Santo vive e reina por todos os séculos dos séculos.

Antitistae: Amem.
Bispos: Amém.


Continua...