Introdução
Assim disse São Thomaz More certa vez: "É mais breve e
rápido escrever heresias que responder a elas." Com isso justificamos e
desculpamos nossa demora em responder a certas acusações de liberalismo na
atual Casa de Orleans-Bragança. Não que nossos adversários sejam hereges no
sentido estritamente teológico do conceito, mas suas orientações demonstram um
profundo desconhecimento de matéria filosófica, política e até teológica.
De fato sob a desculpa de seguir uma espécie de tomismo
puríssimo, baseado unicamente na repetição de artigos da “Summa” e propondo-se
absterem-se do ato de filosofar, ou seja, de desenvolverem um pensamento com as
premissas tomistas e deles inferirem silogisticamente uma conclusão, eles
demonstram ter se apegado a um ente puramente ideal e cerebrino, uma abstração
que idealizaram, como sendo o tomismo. Além e aquém dessa pretensão de serem
filósofos melhores que todos os outros filósofos atuais, pretensão esta que
Chesterton em sua biografia de Santo Tomás nega com uma humildade candente ao
dizer: “Eu não sou como o padre D’Arcy, (...), um filósofo douto, treinado na
técnica da ciência.” [1] Deles se pode dizer com Dom Odilão Moura, que tendo
“um desejo de acatar a orientação vinda da Santa Sé, que determina seguir-se as
pegadas do doutor angélico, satisfazem a própria consciência denominando-se
‘tomistas’. Contudo, ao se procurar saber mais a fundo o que pensam sobre o
tomismo, ou o desconhecem totalmente porque jamais leram sequer, de modo atento,
uma só obra de S.Tomas, ou o recebem num contexto kantiano ou teilhardista. Com
raríssimas exceções, os que escrevem sobre S. Tomás ou o citam, é apenas para
desfigurá-lo.”[2]
Demonstram essa ignorância quando, juntam a pretensão de ser
filósofos, à pretensão de ser cientistas políticos, não sabendo, no entanto, a
sutil diferença entre a filosofia do direito, e a ciência do direito, a
filosofia do poder, e a ciência política com a filosofia geral, acreditando que
aquelas ciências, podem explicar unicamente se aplicando os conhecimentos que
tenham nesta. Em seus textos eles demonstram estarem completamente alheios ao
conhecimento jurídico, e da problemática jurídica atual, bem como alheios de
qualquer conhecimento em ciência política e Teoria do Estado. Provavelmente
nunca estudaram, ou ouviram falar de Gustav Radbruch, Tomás Antônio Gonzaga,
Cristiano Tomasio, Miguel Reale ou Hans Kelsen, só para citar alguns autores
que todo aquele que se propõe a estudar ciências sociais e políticas têm que ao
menos conhecer de nome.
Ademais, ignorando o magistério perene da Igreja, em
especial Pio VI, Leão XII, Pio IX, Leão XIII, São Pio X, Pio XI, e Pio XII, têm
a pretensão descarada de poder definir com base em especulação teológica quem
sejam os reais herdeiros do trono do Brasil, imaginando que teologia, filosofia
e política sejam ciências que se estudem pelas mesmas regras.
Essa gente, além do ente imaginário e cerebrino que definem
como filosofia tomista, possui ideias políticas que podemos dizer, novamente
com Dom Odilão Moura [3], são fruto “da indistinção entre o essencial e o
acidental” de onde decorre sua tese de que a “Idade Média é a única civilização
adequada” ao ensinamento da Igreja, e que a monarquia medieval “é o único
regime político cristão” que um católico pode defender (esquecendo todas as
formas de governo medieval diferentes das monarquias francesa, germânica,
lusitana, castelhana, lyonesa, aragonesa e galícia), e na falta delas uma
república presidencialista governada por um santo como Garcia Moreno.
Que são as ideias políticas e filosóficas deles senão uma
idealização, digna de Rousseau e o mito do bom selvagem, de uma sociedade
puríssima, como puríssima pretendia ser a sociedade sem governos de Bakunin e
outros revolucionários.
Desassociando-se da realidade esses pseudotradicionalistas
criaram um ente mitológico, e apegados a ele buscam com fremente fúria e
orgulho, quase que como crentes em algum dogma de fé solenemente pronunciado
por um papa ou concílio, que todos tenham os mesmo ideais políticos surreais de
modo que como seita, excluem de seus círculos de amizade os que não aceitam-no.
Também desconsideram como se fossem revolucionários quaisquer grupos, quer
filosóficos, ou políticos, que discordam de suas posturas. Na prática, quando
se tratam desses grupos, eles sempre buscam o menor indício ou aparência
daquilo que eles mesmos consideram errado, são homens e mulheres (mulheres
interessadas em política?) que buscam o chifre na cabeça do cavalo para
justificar a própria inércia e esperança sebastianista num governante
milagroso, que faça tudo voltar a ser como eles acham que era. São caçadores de
unicórnio em busca deste chifre na cabeça do cavalo, crentes no ente
imaginário, perdendo o tempo de braços cruzados enquanto o mundo real se desfaz
ao seu redor.
Para responder a todas as suas acusações contra a Casa de
Orleans-Bragança, e para servir de elucidação a todos os Católicos
Monarquistas, iniciamos então esta série, este estudo, que não pretende trazer
a lume nada de novo, ou surpreendente, apenas esclarecer. Tampouco nós nos
consideramos tomistas, já que esta pretensão é como diz o Padre Berto, “uma
pretensão ridícula” [4], nos propomos apenas demonstrar que:
I) É necessário crer que a Monarquia é, conforme a doutrina
da Igreja, o melhor dos regimes;
II) Mesmo corrompida e apesar da corrupção do monarca,
preferível, conquanto mal menor;
III) Nunca um monarca perde por heresia ou qualquer pecado
contra a fé o seu direito sucessório;
IV) Nenhum tipo de monarquia pode ser considerado
intrinsecamente liberal;
V) Nossa independência e governo de Dom Pedro I, bem como
seu sistema político (a Carta Constitucional de 1824) não foram ilegítimos ou
prejudiciais à Igreja;
VI) Como a república além da ilegitimidade sempre foi
prejudicial à nação e à Igreja;
VII) Dom Pedro II não era um inimigo da Igreja como o pintam
muitos católicos;
VIII) Não são liberais os atuais herdeiros da Coroa Imperial;
IX) Tampouco sua proposta pode ser qualificada de liberal;
X) Como desde o exílio da Família Imperial, a Princesa Isabel
e seus herdeiros conduziram o movimento com prudência e os motivos para esta
prudência;
XI) Concluiremos explicando porque o movimento monárquico
admite maçons, protestantes, hereges e o que seja, bem como até que ponto isso
é admissível.
Luiz
Cordeiro Mergulhão Silva
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[1]
CHESTERTON, Gilbert Keith, “Santo Tomás de Aquino, Colección Austral nº 20,
Editora Espasa-Calpe, Madrid, 1973, pág.. 137)
[2] DOM
ODILÃO MOURA, “Ideias Católicas no Brasil”, Editora Convívio, 1978, pág.212.
[3] DOM
ODILÃO MOURA, “Ideias Católicas no Brasil”, Editora Convívio, São Paulo, 1978,
pág. 206.
[4] Pour
La Sainte Eglise romaine, págs..79-80, in Dom TISSIER DE MALLARAIS, Monseñor Lefebvre, La biografía,
Ediciones Rio Reconquistas, Buenos Aires, 2010, pág. 54.
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