quinta-feira, 27 de outubro de 2011

VERITAS IPSA






Tendo circulado em uma pseudo comunidade monárquica umas bobagens escritas por um rapazola ateu atacando a Santa Igreja e acusando-a de pregar que os negros não tem alma, e outras sandices do gênero, resolvi divulgar o excelente e-mail que me mandou o jovem advogado Dr. Rodrigo Rodrigues Pedroso, da Associação Comercial de São Paulo, no dia 31 de janeiro do corrente ano. Que São Benedito tenha pena dos muitos jovens mal formados que pululam por aí.




Paulo Evaristo "Woolf"






Texto de Rodrigo Rodrigues Pedroso:



Em 1537, a Igreja condenou a escravização dos indigenas da America (as "partes Occidentaes") e da Africa ("os do Meio-Dia") pela bula Veritas Ipsa, do Papa Paulo III. Aos traficantes de escravos, posteriormente, foi cominada a pena canônica de excomunhão. O cristianismo já havia sido o responsável pelo desaparecimento da escravidão na Europa, no século V. Efetivamente, toda a economia do Império Romano estava assentada sobre a exploração da mão-de-obra escrava. Pelo direito quiritário de Roma Antiga, o escravo não era considerado pessoa perante o direito, mas mera coisa, sem qualquer direito a ser respeitado. Os escravos, por exemplo, não tinham o jus conubii (o direito de casar-se), as uniões entre escravos não eram consideradas casamento, mas contubernium, como entre os animais. Se o senhor estuprasse uma escrava ou matasse um escravo de sua propriedade, nenhum crime cometeria, tal como se fizesse o mesmo com o seu cachorro. Foi a Igreja, com a ascensão do cristianismo, que obrigou os senhores a reconhecerem direitos aos seus escravos: direitos como o de constituir familia legitima, o de possuir bens, o de ter tempo livre para descanso. Com o cristianismo e o reconhecimento de direitos aos escravos, estes tiveram reconhecida a sua personalidade civil, foram reconhecidos como pessoas perante o direito, e a escravatura extinguiu-se para dar lugar à servidão da gleba, em que cada servo estava ligado a um pedaço de terra, do qual não poderia ser privado.Todavia, no século XVI, houve o retorno da escravidão ao Ocidente, devido à má influência que os maometanos exerceram sobre os portugueses, com as Grandes Navegações. Os portugueses, vendo que os maometanos ainda praticavam a escravidão em seus dominios na Africa, resolveram introduzi-la na América. Como já vimos, a Igreja condenou a escravização dos indigenas americanos e africanos, e estipulou a pena de excomunhão para quem praticasse o tráfico de escravos. Por que dessa vez não deu certo? Porque na época, como hoje na questão do aborto, existiam os Católicos pelo Direito de Escravizar, dentre eles muitos marranos (judeus que adotaram o catolicismo apenas com o interesse de não serem expulsos de Portugal).Segue a bula de Paulo III, na ortografiado do português antigo.






Rodrigo R. Pedroso.



Veritas Ipsa






Paulo III, a todos os fiéis Christãos, que as presentes letras virem, saúde, e benção Apostólica.






A mesma Verdade, que nem pode enganar, nem ser enganada, quando mandava os Pregadores de sua Fé a exercitar este officio, sabemos que disse : "Ide, e ensinai a todas as gentes. A todas disse, indifferentemente, porque todos são capazes de receber a doutrina de nossa Fé. Vendo isso, e invejando-o o comum inimigo da geração humana, que sempre se oppõe às boas obras, para que pereçam, inventou hum modo nunca dantes ouvido, para estorvar que a palavra de Deus não se pregasse às gentes, nem ellas se salvassem. Para isso, moveu alguns ministros seus, que desejosos de satisfazer as suas cobiças, presumem affirmar a cada passo, que os Índios das partes Occidentaes, e os do Meio Dia, e as mais gentes, que nestes novos tempos tem chegado a nossa notícia, hão de se interessar tem chegado a nossa notícia, hão de ser tratados e reduzidos a nosso serviço como animais brutos, a título de que são inábeis para a Fé catholica : e socapa de que são incapazes de recebella, os pôem em dura servidão, e os affligem, e opprimem tanto, que ainda a servidão em que tem suas bestas, apenas eh tão grande como aquella com que affligem a esta gente. Nós outros, pois, que ainda que indignos, temos as vezes de Deos na terra e procuramos com todas as forças achar suas ovelhas, que andam perdidas fora de seu rebanho, pera reduzillas a elle, pois este hé nosso officio; conhecendo que aquelles mesmos Indios, como verdadeiros homens, não somente são capazes da fé de Christo, senão que acodem a ella, correndo com grandíssima promptidão, segundo nos consta; e querendo prover nestas cousas de remedio conveniente, com authoridade Apostolica, pello teor das presentes letras, determinamos, e declaramos, que os ditos Indios, e todas as mais gentes que daqui em diante vierem à notícia dos cristãos, ainda que estejam fóra da Fé de Christo, não estão privados, nem devem sello, de sua liberdade, nem do domínio de seus bens, e que não devem ser reduzidos a servidão. Declarando que os ditos Indios, e as demais gentes hão de ser atrahidas, e convidadas a dita Fé de Christo, com a pregação da palavra divina, e com os exemplos de boa vida. E tudo o que em contrario desse documento se fizer, seja em si de nenhum valor, nem firmeza; não obstante qualquer coisa em contrário, nem as sobredittas, nem outras em qualquer maneira.






Dada em Roma, anno de 1537, aos nove de junho, no anno terceiro de nosso Pontificado.






Paulo PP. III

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