Dom Pedro Henrique, Dom Luis, Dona Maria Pia e Dona Pia Maria |
TESTEMUNHO DO
SANGUE
A
vida do jovem transcorria num meio relativamente restrito á família. Poucas viagens.
A primeira ao Brasil, por ocasião do Centenário da Independência, em 1922.
Viagem marcada pela morte do avô a bordo do 'Massilia', quando o navio entrava
em águas brasileiras.
Outras,
com seu tio, o infante Carlos de Bourbon-Sicília, à Argélia e à Tunísia. Delas
fez um relatório de notas concretas, com fatos, isento de impressões pessoais.
Brincava
com seus irmãos e primos, preferia os jogos de estratégia e inteligência, nos
quais exigia absoluto silêncio. Mas, explodia com as outras crianças num ruidoso
esconde-esconde que ia do sótão ao porão, que parecia um tufão a varrer as
escadas, estremecendo os lustres do teto. Perseguiam-se vertiginosamente, até
pelos telhados, de tal forma que os vizinhos vinham preocupados avisar à
família imperial que 'as crianças acabariam se matando.'
Também
fazia um curioso trenó de madeira, retirada da mesa, que descia a montanha
vertiginosa da escadaria do salão de festas.
Gostava
de futebol, passeios de automóvel pela França, andar de bicicleta por Provença,
nadar e praticar regatas na costa de Cannes.
Sua
rotina diária: levantava-se rapidamente, três passos, um beijo no crucifixo.
pontualidade na hora da aula, com as lições estudadas. Repetia com firmeza os
textos de Virgílio, ou de Corneille, ou então um texto litúrgico, ao qual
reservava especial aplicação.
Digno
e polido para com os empregados, nunca abusava de seus serviços. "Sempre
servia antes de mandar." - Lembrava um deles.
Desde
criança, sempre preocupado em não incomodar os outros, escondia seus
sofrimentos. Seguia o lema de seu pai: "Nunca se queixar de nada."
Uma
camareira comentava sobre ele: Aquele menino não tinha amor algum por si mesmo.
Para ele, o próprio corpo não existia."
Nunca
lhe agradou ver espetáculos imodestos, nunca sorrira maliciosamente. Certa vez,
folheando um revista de ilustrações ousadas, jogou-a longe e disse: "Que
estupidez, francamente."
Não
era, contudo, um insensível à reações exteriores, amava, mas com pureza.
Certa
feita, no Castelo d'Eu, ele brincava com uma menina brasileira. Parou, por um
momento, a observá-la e disse com um amável sorriso: "Que bonitos olhos
negros você tem." Outra vez, no Brasil, com outra menina, passeando no
jardim, ela parou diante de uma roseira, e ele veio com um galanteio:
"Nenhuma delas é tão bonita quanto você, Senhorita!"
Coitado
daquele que viesse a recordar esses episódios diante do herói, receberia uma
resposta bem dada e desconcertante.
D.
Luís, com sua simplicidade e simpatia, conquistou o coração dos brasileiros,
ainda saudosos dos tempos de D. Pedro II.
Era
patriota, e sentia orgulho da raça brasileira. De volta à França, seu
patriotismo não desgostava os fiéis da Casa de França. Recebera os germens de
amor à pátria brasileira no exílio, por parte da Imperatriz de Direito, e por
parte do conde d'Eu que contava ardentemente as vitórias de Peribebuí e Campo
Grande durante a guerra contra o Paraguai.
No
curso de educação, os tropeços eram inevitáveis, mas ele reagia sempre:um maus
caráter, eu sei, mas vou me corrigir..."
Certa
vez, o autor deste livro o repreendeu por algum excesso de vivacidade. pouco
depois ele batia sem sua porta, fortemente, chorando: "Quero uma punição,
eu mereço."
Sua
consciência delicada, jamais chegava aos escrúpulos. Sempre pronto a abnegar-se
em favor dos outros, incluso do Fox Terrier, que havia corrigido com os dentes
a beleza tão odiada por ele de seu nariz bourbônico. Sangrando, pediu à mãe que
o poupasse, pois o incidente era culpa sua. Saiu, contente desta história, já
que nada lhe desagradava mais que ser bonito.
Demonstrava
uma grande independência de espírito. Certa feita, num serão familiar, se lia e
estudava as narrativas dos trois glorieuses e do advento ao trono do ramo mais
novo dos Bourbons. Ele, timidamente, concentrado e pensativo disse:
"Talvez, Luís Felipe fosse... um pouco usurpador."
Os
Orleans e Bourbons haviam lhe legado a aptidão e o gosto pela ação. Mas sua
alma se extasiava em demasiada paz e tranqüilidade, contemplação e gosto por
admirar a beleza das catedrais européias. A de Chartes, é a mais bela de
todas."
A
graça da Fé, transportava sua alma para junto do coro de gerações dos fiéis,
invisíveis, que povoam aquelas naves, onde (...)ele não pensava, mas tinha, no
entanto, colóquios com a Virgem. Sua alma se abria numa contemplação sem
palavras, numa contemplação de pura Fé. Da Belle Verrière. Maria se inclinava
para você num convite sorridente: "Isto aqui é belo, mas o Céu, onde reino
com meu Filho, é mais belo ainda, vem, não demores! A terra não é para os puros
e sinceros como tu."
Notre
Dame du Port foi a última que admirou.
Amava
o Brasil e a França, sempre dizia: "Depois do Brasil, nenhuma pátria é
mais bela que a França!"
O MAS SAINT LOUIS
Como
ele amava o Mas Saint Louis. Chamava-o Paraíso de Mandelieu!
A
moradia não era vasta, mas aconchegante e suficiente para a família. Parva sed
apta, construída em estilo provençal.
Ao
pé do Esterel, entre pinheiros e ciprestes, construído de modo que se podia ver
das janelas os jardins e a baía, escondendo-se somente a enseada de Théole pelo
Monte Saint Pierre.
A
leste, os Alpes, cujas neves até abril se confundem com as nuvens.
Dom
Luís gostava de admirar os barcos que visitavam a baía desde sua janela do
quarto do Mas Saint Louis. Quando não, e isto mais que admirar, dar uma volta
no Crévard, Vvltando com o barco carregado de linguados, pescadas, ou
rodovalhos. E se este virava, nadava de dar inveja aos habitantes do mar. Às
vezes reservava as lanchas de Luis Fanciuli, e quando não ia com a família para
as sombras dos pinheiros comer bouillabaisse(sopa de frutos do mar).
Do
quarto do ângulo esquerdo do primeiro andar, se podia ver sua silhueta
acolhedora sorrindo para este amigo, quando o visitava no Mas.
Porém,
à memória do visitante veio uma queixa do rapaz a sua mãe quando o médico lhe
aconselhou a ir para as montanhas respirar ar fresco: Mamãe, fiquemos em
Mandelieu! Se você me levar, não o verei mais." Ele não gostava de
dramatizar nada, e disse isso com extrema sinceridade.
Fisicamente,
era bem saudável, seu aperto de mão esmagava as falanges de quem o
cumprimentava, os joelhos dominava a montaria, e os tornozelos se moviam para
um potente chute de futebol (afinal, era príncipe do Brasil ou não?). Mas o que
dizer de reações violentas, bater de portas ferir a cabeça contra a parede do
quarto? Era o primeiro tempo ao qual sucedia, imediatamente um segundo, o do
controle vitorioso, sorridente e conciliador. A tempestade seguida de bonança.
Desapegado
de todas coisas que comumente agradam à juventude. Guardava em seu bolso, a
esmola do capelão, e uma cama de vento lhe bastava se pendesse desde a
cabeceira um crucifixo. Quiseram dar a seu quarto uma melhor decoração:
"Assim como está basta!" - Lhes respondeu. Sua mãe quis trocar seu
pequeno Peugeot 201 por um veículo mais possante: "O meu está bom!"
Com
os parentes, deferência afetuosa, disposição espontânea, e sincera em prestar
serviços e ceder o melhor lugar.
Não
podemos deixar de citar um episódio tal qual contaram a Monsenhor René Delair.
Quando
ainda menino, viajava com a família de trem e uma senhora proferiu um elogio:
"Que menino bonito!"
Ele
socou o nariz com a testa crispada de raiva e repetia: "É chato ser
bonito, isso faz você me olhar."
BEM NA MODA
Desde
o levantar-se, quando beijava seu crucifixo de madeira. (Confesso que passei a
fazer isso quando li o livro), Até se deitar, quando repetia o gesto, piedoso,
D. Luís Gastão mostrava-se um perfeito filho do dever.
Que
adolescente austero! - dirão. Sim, era a disciplina de vida que demonstrava
profundas convicções cristãs. Mas, D. Luís Gastão nunca foi um santo triste e
introvertido (Dizíamos no seminário de La Reja, que um santo triste é um triste
santo). Encontrava o objetivo principal de seu músculos na atividade física.
Cavaleiro consumado, seu porte sobre o animal era de correção acadêmica.
"Eis o duque de Aumale." - exclamava o professor que conhecera seu
tio-bisavô.
A
refeição em família ainda não tinha acabado e ele já vivia com o irmão, a
partida de futebol planejada.
Estava
perfeitamente a par dos acontecimentos esportivos, dos quais nenhuma minúcia
escapava. Fazia cronogramas com letra serrada e regular, dum campeonato
esportivo, bem na moda. Era um ansioso torcedor da equipe francesa. (Nota de
rodapé: eram raras as equipes brasileiras na época).
Adversário
temível, mas cortês, ele logo se colocou no primeiro plano nos campeonatos de
Cannes. Até hoje os amadores lembram-se dele (...) nos campos de tênis de Beau
Site e de Hespérides. Auto, moto, regatas. (...) Empreendia audácias nas águas
caprichosas do lago de Lucerna na Suíça, com seus primos arquiduques da
Áustria. chegou a completar em quatro horas, a distância de Lucerna a Fuellen
(36 KM), a remo com seus primos supracitados. E como ele estava orgulhoso
disso.
Como
todos os enérgicos ele não amava a vida por ela em si, mas por seu emprego
interessante e generoso.Sua timidez natural, dava lugar, dia a dia, e cada vez
mais, àquela alegria que se inspirava em todas as circunstâncias.
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