terça-feira, 2 de julho de 2013

GABRIEL GARCIA MORENO - III

  
CARRION ELEITO PRESIDENTE – NOVAS AGITAÇÕES POLÍTICAS – VIUVEZ E SEGUNDO CASAMENTO
 (1.864 - 1.868)

        Jerónimo Carrion foi eleito para suceder García Moreno e cercou-se de péssimos elementos que o aconselharam a enviar este grande estadista ao Chile como embaixador. García Moreno obedeceu e seguiu para a república do extremo sul.
       Chegando ao porto de Lima, Peru, foi ter conferência com o presidente daquela nação, antes de seguir viagem ao Chile. Mal havia ele subido no trem, foi agredido por um tal de Viteri, que disparou sobre ele dois tiros de revólver, com que foi levemente ferido na testa e na mão esquerda. Antes que tivesse partido o terceiro tiro, García Moreno tinha agarrado o braço do meliante e desviado a bala. Se bem que dispusesse da vida do seu inimigo, por magnanimidade, contentou-se em apenas evitar a própria morte. Que senso de inimigo ele tinha! Em Latim há duas palavras para designar "inimigo": HOSTES e INIMICUS. A primeira significa o inimigo da pátria e a segunda o inimigo pessoal. A estes segundos, Cristo mandou-nos perdoar e amar (S. Lucas, VI, 35), como fez García Moreno. Mas aos primeiros, os inimigos da Igreja, da Religião e da pátria, devemos combater, como ele.
           No Chile prestou mais um grande serviço à pátria e, concluídos todos os trabalhos, voltou à Quito. A sua presença na capital foi o suficiente para impedir a continuação da campanha urbinista que estava a acontecer.
        A sua esposa, Rosa Ascasubi Moreno, não lhe havia dado filhos saudáveis. Duas meninas que lhe nasceram por volta de 1.848 e 1.850, faleceram pouco antes de completar um ano de idade e mais outras duas gestações, que resultaram em duas meninas natimortas, privaram o lar de Gabriel García Moreno da alegria das crianças. Mas ele sabia que em tudo isto ia os desígnios de Deus e sabia que era a vontade d’Ele que devia prover o lar de crianças ou privá-lo delas. Por fim, teve que sofrer a cruz da viuvez, quando em 1.865, a sua amada esposa, Dona Rosa, faleceu aos cinqueta e quatro anos de idade.
           A virgindade é muito estimada por Deus nos jovens e nas pessoas consagradas à Ele, como o é a castidade dos viúvos mais estimada do que o casamento. Mas São Paulo, mesmo enaltecendo por inspiração divina a virgindade e o celibato (I Cor., VII, 33), também disse que quem casa não peca (I Cor. VII, 28). E Gabriel García Moreno, encontrando na sobrinha da primeira esposa, Mariana del Alcazár y Ascasubi, a futura companheira ideal, casou-se com ela em abril de 1.866 . A providência deu à este casal três filhas, que não chegaram a atingir dois anos de idade, mas deu também à García Moreno, como recompensa pelos seus esforços, um menino, Gabriel María García del Alcazár (falecido em 1931).
  
GOVERNO DE ESPINOSA – CATÁSTROFE DE IBARRA – PRESIDENTE INTERINO
 (1.867 - 1.869)

           Espinosa foi eleito presidente, sucedendo Carrion e com ele os liberais foram tendo decisiva influência no Governo. Desgostoso cquanto à isso, García Moreno retirou-se para a sua fazenda perto de Ibarra. Entretanto, nem assim conseguiu descansar.
           Na noite de 15 para 16 de agosto de 1.868, um terremoto violento abalou a cidade de Ibarra e toda a província deste nome. A cidade tornou-se um monte de ruínas e uma vasta necrópole. Metade da população havia sucumbido e a outra metade, viúva ou órfã, estava no meio dos cadáveres, e ruínas, sem pão, nem abrigo ou esperança. Para cumular tantas misérias, bandos de infames saqueadores, espalharam-se como aves de rapina sobre carcaças, para roubar o pouco que este povo miserável possuía e os índios da província vizinha baixaram das montanhas, ávidos de sangue hispânico, matando os ibarrenos que encontrassem.
           O Governo teve a feliz inspiração de recorrer à Gabriel García Moreno como o único capaz de reparar em pouco tempo tão cruel desastre. Foi nomeado chefe civil e militar da província de Ibarra, com aplausos de toda a nação e vitupério dos liberais, que exprobraram a escolha de Espinosa.
           Gabriel García Moreno não hesitou em sacrificar a tranquilidade de que gozava na sua fazenda. Viajou às ruínas de Ibarra com os soldados encarregados de perseguir os salteadores e índios, enterrar os mortos, e salvar os ibarrenos ainda vivos. Mandou castigar severamente os delinquentes, afim de lembrar ao povo os sentimentos de justiça e respeito à autoridade. Mas foi para com os comerciantes, que vergonhosamente especulavam com a miséria dos habitantes, que ele se mostrou mais inexorável e em breve tempo restabeleceu a segurança, e a ordem pública nas cidade e província de Ibarra. Para reconstruir a cidade foi mais difícil, como dispunha de poucos recursos públicos para alimentar os sobreviventes famintos, mandou vir comboios de sua própria fazenda e coordenou toda a sorte de grupos voluntários. O povo o aclamava como salvador, o que inspirou cada vez mais a fúria e o ódio satânico dos liberais de Guayaquil, e Quito, que organizaram, frustradamente, uma campanha contra García Moreno, difamando-o nos jornais e fazendo pequenas rebeliões para atrapalhar o trabalho de auxílio aos ibarrenos. O próprio povo de Ibarra retrucava-os em outros periódicos: “...nós lhe seremos devedores da nossa ressurreição social e política...”
           Dois meses apenas depois do desastre, García Moreno deixou Ibarra em estado muito adiantado de reorganização e foi dar conta da sua missão ao presidente, que lhe deu em nome de todo o Equador os maiores agradecimentos. Enquanto isso, os urbinistas se preparavam para as eleições, indicando Aguirre para a presidência. Vendo em perigo a sua pátria e o Catolicismo, Gabriel García Moreno aceitou a sua indicação. Os liberais vendo que seriam derrotados pela popularidade de García Moreno, tomaram o poder à força, mas ele levantou as guarnições militares e ficou à testa do Governo como presidente interino. Logo restabelecida a ordem, pediu demissão do cargo à Convenção, que a rejeitou. Mas ele permaneceu firme e conseguiu com que a Convenção elegesse o irmão de sua primeira esposa, Manuel Ascasubi, como presidente interino. Este, por sua vez, o fez desde então assumir o Ministério da Fazenda e o das Forças Armadas.
           Como membro da Convenção, fez encher o Plenário com a sua palavra forte e sadia, fazendo com que o Equador viesse a ter, finalmente, uma constituição católica. A sua coragem foi mais longe quando conseguiu fazer aprovar o dispositivo seguinte: “Todos os indivíduos que pertencem à uma sociedade condenada pela Igreja, perdem, por isso mesmo, todos os direitos de cidadão.” Acusado de tirano por aprovar este dispositivo da constituição, respondeu com a sua frase lapidar: “Liberdade para todos e para tudo, exceto para o mal, e para os malfeitores.”

  
PRESIDENTE DA REPÚBLICA PELA SEGUNDA VEZ – INVASÃO DE ROMA – RETRATOS DE SUA PIEDADE
 (1.869 - 1.875)

             A Convenção elegeu-o presidente da República, ao que ele acedeu resignadamente. Foi o primeiro a fazer o novo juramento: “Juro por Deus Nosso Senhor e estes Santos Evangelhos cumprir fielmente o meu cargo de Presidente da República, e professar a Religião Católica Apostólica e Romana!”
           Novas revoluções vieram abalar o seu governo e uma conspiração foi descoberta antes que o ferro assassino pudesse ferir o grande estadista. Serenados os ânimos, iniciou uma série de reformas. Consolidou as finanças e enriqueceu a sua pátria com grandes obras de engenharia. Reorganizou o exército, dando-lhe diretrizes católicas.
           A guarnição de Quito mudou de face de uma tal forma que os seus soldados tornaram-se modelo de exatidão no cumprimento dos deveres e de piedade cristã. Certa vez um tenente encontrou um maço de notas avultadas e, sem pestanejar, entregou-as ao presidente, o qual mandou procurar o dono, e lhas entregou. O dono do dinheiro ficou tão grato pela honradez do tenente que o quis recompensar com alguma soma das notas e, por causa da honra, o tenente recusou. Gabriel García Moreno, não hesitou em tornar aquele homem honrado capitão do exército. Todos temiam a sua energia e fibra para punir o menor crime com severidade, mas ao mesmo tempo amavam-no pela sua dedicação, e espírito de justiça.
           Reorganizou as instruções primária, secundária e superior nas bases do Cristianismo. De 1.869 a 1.875 estendeu a sua ação, insistindo e trabalhando com os bispos para a reforma do Clero. Transformou as prisões e hospitais em verdadeiras missões à disposição dos padres dispostos a trabalhar com as almas empedernidas pela doença ou pelo crime.
           Nunca se esquecia das obras de Caridade, visitando hospitais e certificando-se de que as pensões do Governo estavam a ser recebidas, e bem usadas e, quando via que eram insuficientes, completava a soma com o dinheiro do próprio bolso, como ficou evidente no episódio do jantar da primeira presidência.
           Mostrava-se sem piedade para com todos que abusavam do poder para tiranizar ou simplesmente enriquecer às custas dos pobres e fracos. Estes, por sua vez, tão bem o sabiam que preferiam recorrer ao presidente antes que aos tribunais. Em qualquer parte em que andasse, cercavam-no multidões de pobres e perseguidos a pedir justiça. Então, como São Luiz, Rei da França debaixo do carvalho de Vincennes, escutava-os com bondade e, achando que tinham razão, condenava o opressor. Certa vez ordenou que um soldado desse dez mil piastras à uma mulher que as reclamava de um rico proprietário que lhas extorquira. O soldado pagando, perguntou como reaveria esta soma aos cofres públicos. Gabriel García Moreno indicou o nome do proprietário como devedor destas dez mil piastras.
           As tropas piemontesas invadiram a cidade de Roma a 20 de Setembro de 1.870, violando os direitos da Igreja. O glorioso Pontífice, então reinante, Pio IX, conservou-se firme diante dos atentados contra a sua soberania e excomungou os invasores. Enviou à todos os governos do mundo o seu protesto contra o desrespeito contra os direitos da Igreja. Nenhum governo teve coragem de protestar em nome da justiça contra o atentado de Roma. Entretanto, do pequenino Equador fez-se ouvir a voz de um homem, Gabriel García Moreno, único chefe de governo no mundo que teve coragem de protestar contra a invasão, se impondo à admiração dos católicos de todo o orbe pela coragem e amor à Igreja.
           Perguntaram-lhe um dia porque não levantava um teatro em Quito. Respondeu com vivacidade: “Levantem-no os ricos, os nobres, não me oponho; mas a Nação é pobre e faltaria à minha consciência se me atrevesse a desviar os escassos fundos públicos, privando a todo o povo do honesto, necessário, e útil para empregá-lo no acessório e deleitável. O povo trabalhador não quer, nem pede teatros; o que ele quer, e com razão, é não despenhar-se nos abismos com os seus animais de carga no trajeto entre Quito e Guayaquil.”
           Entre todas as virtudes que nele brilharam, aquela que mais naturalmente caracterizou-o foi a fortaleza de ânimo, como depreendemos de sua vida inteira. Contudo, não era por temperamento que ele se mostrava tão forte contra os revolucionários, contra os maus e contra si mesmo, era para obedecer à voz imperiosa de sua consciência reta, e esclarecida. Era por amor ao dever, o que os seus pais lhe ensinaram desde a meninice. Era porque a sua fortaleza estava acompanhada de prudência cristã, a qual ensinava a fazer em tudo passar os direitos de Deus e da Igreja antes dos direitos dos homens.
           Expulsou os maus do Governo, não para reinar em lugar deles, mas para restabelecer a ordem, salvar a pátria e fazer imperar Deus no Equador. Suportava todas as calúnias e afrontas, quando dirigidas contra ele. Escreveu certa vez à um religioso: “Pedi à Deus que me dê bastante força, não só para que faça bem àqueles que por palavras e escritos derramam contra mim as torrentes de ódio, mas ainda para que me alegre diante de Deus por ter que sofrer alguma coisa em união com Nosso Senhor. É para mim uma felicidade e uma honra imerecida ter que suportar os insultos da revolução, em companhia das ordens religiosas, dos bispos e do próprio Sumo Pontífice.”
            O povo, por sua vez, o admirava profundamente. Diziam uns bons lavradores, junto dos quais ia ele às vezes descansar: “Quando o presidente vinha viver conosco, como um particular, certo é que nos corrigia e castigava, mas era um santo: pagava-nos bem, nos premiava, rezava conosco o Rosário, explicava-nos o Evangelho, nos fazia ouvir a Missa e nos preparava para a Confissão, e Comunhão. Então, havia paz e abundância nestes campos, porque só a presença do presidente desterrava os vícios.”
           Fossem quais fossem as suas ocupações, fazia todos os dias trinta minutos de meditação com os seus livros favoritos, o Evangelho e a Imitação de Cristo. Nunca deixou de fazer os exercícios espirituais de Santo Inácio de Loyola. Concebeu assim essa tão grande idéia da majestade de Deus e repetia sempre que estava atribulado: “Deus não morre!” A Deus sempre atribuía todos os bens que fazia. Certa vez no Congresso, depois de dar contas dos progressos realizados, disse: “Se falo destes felizes resultados, não é para glória minha, mas para a glória d'Aquele à Quem tudo devemos e à Quem adoramos como nosso Redentor, nosso Pai, nosso Salvador e nosso Deus.” Tinha grande respeito pelos sacerdotes. Certa vez um capuchinho apresentou-se à ele com o solidéu na mão: “Cobrí-vos, padre!” – disse o presidente, tirando o chapéu. “Um pobre religioso, redarguiu o padre, não pode estar de cabeça coberta diante do presidente da República!” Ao que García Moreno respondeu: “Não, padre, o chefe do Equador nada é na presença de um sacerdote do Altíssimo!” E ele mesmo colocou o solidéu sobre a cabeça do frade.
           Para darmos ideia adequada da firmeza da sua Fé, nada podemos dar mais probante do que as resoluções que ele escreveu na última página de sua Imitação de Cristo:
           “Todas as manhãs farei a oração e pedirei particularmente a virtude da humildade. Todos os dias assistirei a Missa, rezarei o Rosário, lerei um capítulo da Imitação e este regulamento. Cuidarei em me conservar o mais possível na presença de Deus, sóbrio das conversas, afim de não dizer palavra alguma demais! Oferecerei muitas vezes o meu coração à Deus, principalmente no começo das minhas ações. Direi cada vez que soar a hora: "Sou pior do que um demônio e o Inferno devia ser a minha morada!" Estando no meu aposento, nunca rezarei sentado, podendo fazê-lo em pé. Fazer atos de humildade, beijar a terra, desejar toda a sorte de humilhações, alegrar-me, quando censurarem a minha pessoa ou os meus atos. Nunca falar de mim, a não ser para confessar os meus defeitos e faltas. Todas as manhãs porei por escrito aquilo que tiver de fazer no dia. Observarei escrupulosamente as leis em todos os meus atos. Confessar-me-ei todas as semanas. Não passarei mais de uma hora a jogar e nunca antes das oito horas da noite.”
            Gabriel García Moreno sempre seguia à risca esse regulamento. Acolitava à Missa, preparando ele mesmo os paramentos para o uso do padre. Rezava o Rosário com a família e os empregados, e hóspedes de sua casa. Ensinava o Catecismo aos criados. Nunca faltava aos Ofícios de domingo. Visitava frequentemente o Santíssimo Sacramento. Comungava todos os domingos e, às vezes, durante a semana. Quando levavam o Santíssimo à algum doente, ele apressava-se a levar uma vela acessa para acompanhar o seu Senhor, entre a multidão em procissão, como mais um popular.
          Depositava suma confiança em Nossa Senhora, como denota a proclamação da Virgem das Mercês como patrona do Equador, após a sua vitória em Guayaquil. Trazia sempre o escapulário e o terço, que rezava todos os dias. Quis entrar também na CONGREGAÇÃO MARIANA, havendo, porém, em Quito duas, uma para pessoas de distinção e certa riqueza, e outra para operários, entrou na segunda, afirmando: “O meu lugar é no meio do meu povo!”
           De sua devoção para com SÃO JOSÉ deu prova inscrevendo a sua festa nos dias feriados da nação. Mas mais notável foi a sua devoção para com o SAGRADO CORAÇÃO DE JESUS e bem o provou pela Consagração da República à Ele. Essa consagração lhe valeu a coroa do martírio!

Continua...

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