quinta-feira, 27 de junho de 2013

GABRIEL GARCIA MORENO - II






GUERRA COM O PERU – EXPULSÃO DE URBINA
(1.858 - 1.860)

         Já há muito que o Peru tinha contendas com o Equador por questões de limites de terra. O desmando de Robles em ceder parte dessas terras litigiosas aos norte-americanos e ingleses culminou na explosão da guerra.
          A referida Guerra, como ficou dito na postagem passada, interrompeu os sucessos parlamentares de García Moreno, justamente porque o Congresso concedeu poderes extraordinários ao Presidente Robles. Este, por sua vez, munido de tanto poder sobre as casas do Congresso, empossou Urbina como um auxiliar administrativo e militar. Urbina não se deixou esperar para abusar do novo cargo, ordenando a dissolução do Congresso e o fuzilamento dos opositores, entre eles, Gabriel García Moreno.
          Gabriel Garcia Moreno, era patriota, sem dúvida. Mas eis aí a linha tênue que o mundo contemporâneo não enxerga, que está entre o Nacionalismo e Patriotismo. O Nacionalismo é um vício causado pelo amor exagerado à pátria, enquanto o Patriotismo virtuoso é o amor moderado. E amando moderadamente e ordenadamente a sua pátria, reconhecia que o Peru tinha razão quanto às questões de suas cidades limítrofes, injustamente apropriada pelo seu Equador, e mais injustamente cedidas à terceiros. Isso, mais a condenação súbita ao fuzilamento, compeliram García Moreno a refugiar-se em Lima, capital do Peru.
          Assim que teve notícias de que o povo equatoriano finalmente se revoltara contra os desmandos de Urbina e Robles, voltou à sua terra, em uma viagem cheia de perigos, e sacrifícios. Através de florestas densas, desertos imensos e regiões desconhecidas, dirigiu-se à Quito. Perdeu o guia e o cavalo. Viu-se obrigado a achar o caminho sozinho e à pé, exposto a morrer durante a viagem ou a ser preso pelos inimigos, até que chegou ao termo desejado.
          Chegando a Tambuco, não descansou. Tomou ciência minuciosa sobre a situação e fundou um periódico: o “1º de Maio”. Trocando a pena pela espada, pôs-se à frente de cerca de oitocentos homens mal armados e foi ao encontro das tropas de Urbina, e Robles, muito mais numerosas do que as suas. Deu-se a Batalha de Tambuco. Por seis horas incessantes García Moreno sustentou o fogo contra as tropas urbinistas infrutiferamente. Ainda que derrotado na batalha, determinou-se a ir à capital. Quando chegou à Quito, o povo inteiro, satisfeito por vê-lo ainda vivo, fez-lhe estrondosa manifestação.
          Aliou-se ao General Guilhermo Franco em Guayaquil e com ele organizou um governo provisório para, finalmente, derrubar Urbina, e Robles. A luta foi rápida e Urbina, e Robles derrotados foram deportados. Guilhermo Franco, aliado de Gabriel García Moreno, proclamou-se, então, presidente do Equador e García Moreno, percebeu que tinha diante de si um continuador das políticas urbinistas.
          García Moreno, na qualidade de Chefe do Governo Provisório, foi à Guayaquil conferenciar com Franco. Mal tinha ele deixado Guayaquil, quando um bando de assassinos o perseguiu. Escapou-lhes, porém, e se refugiou em Riobamba, onde desejava descansar. Não chegara para ele a hora do descanso. Os antigos soldados de Urbina, estavam ali aquartelados, sob ordens de Franco. Assim que souberam da presença de García Moreno, invadiram os seus aposentos gritando ordens de renúncia ao cargo do Governo Provisório. “NUNCA!” respondeu García Moreno, sem se perturbar. A guarnição prendeu-o e o seu comandante lhes deu ordens de não o perder de vista. Os soldados, porém, se entregaram às dissipações da noite e dos desejos da carne, e foram pouco a pouco abandonando o posto. Ficou, no entanto, um sentinela fiel. García Moreno, dirigindo-se à este único guarda, lhe disse imperativamente:
          – A quem fizeste juramento de fidelidade?
          –  Ao Chefe do Estado. – respondeu o guarda trêmulo.
          –  Pois o chefe de Estado sou eu; teus oficiais são rebeldes e perjuros. Não tens tu vergonha de faltar à Deus e à Pátria? Segue-me!
          O soldado, persuadido de que estava a pecar, passou, então, a ajudar o Chefe de Estado. Preparou a fuga de Riobamba e foi com García Moreno convocar os aliados da vizinhança. Com catorze voluntários, voltou à Riobamba, onde acharam a guarnição traidora embriagada e prenderam dois dos principais bandidos. Formou com os seus catorze um conselho de guerra e os condenou ao fuzilamento por alta traição. Todos os revoltosos, espantados pela severidade do castigo, se sujeitaram a ele, reconhecendo a justiça da pena e se confessando antes de receber a pena capital.
          Restabelecida a ordem em Riobamba, Gabriel García Moreno continuou sua viagem à Quito.

TOMADA DE GUAYAQUIL – GARCIA MORENO PRESIDENTE
(1860 - 1861)
  
          
          Gabriel García Moreno e Antonio Flores Jijón formaram um exército para depor Guilhermo Franco. Escreveram com os seus soldados uma das mais heróicas páginas da história militar das Américas. Esse grande feito marcou a expulsão de Franco.
         O tesouro estava esgotado após tantas revoltas. García Moreno iniciou rápidas reformas políticas na qualidade de presidente interino da República. O Liberalismo dominante o impediu de fazer as câmaras elaborarem uma constituição católica, no entanto, conseguiu manter a Religião Católica como oficial do Estado e fazer aclamar Nossa Senhora das Mercês patrona do Equador. Terminados os trabalhos constitucionais, instituiu o sufrágio universal proporcional(assim, cada pai de família poderia ter direito a tantos votos quantos filhos menores de idade tivesse). García Moreno foi eleito Presidente da República pelo quatriênio que se seguiu.

PRIMEIRA PRESIDÊNCIA – CONCORDATA COM A SANTA SÉ – REFORMAS
          
É interessante contar um episódio que se deu logo após esta primeira eleição. Dona Rosa Ascasubi Moreno, fez-lhe notar que convinha oferecer um banquete oficial aos ministros e ao corpo diplomático. García Moreno lhe respondeu que sua pouca fortuna lhe vedava tal despesa desnecessária. Dona Rosa foi ao seu gabinete e voltou com quinhentas piastras, que deu ao marido para que organizasse o banquete. García Moreno as aceitou enternecido e imediatamente saiu de casa. Mas, ao invés de encomendar o jantar, dirigiu-se ao hospital e entregou a soma inteira às necessidades mais urgentes dos enfermos, e deu-lhes um jantar em honra de sua eleição. Quando se encontrou novamente com sua esposa, disse-lhe: “Pensei que uma boa refeição mais bem faria aos doentes do hospital do que aos diplomatas.” Dona Rosa Ascasubi Moreno, que já conhecia bem a sua generosidade, sorriu e estimou-o mais ainda desde aquela hora.
          O país ainda se encontrava em desordens e Moreno iniciou uma série de úteis reformas. Reorganizou as repartições públicas, consertou as finanças, despediu os empregados públicos desleixados, apurou as responsabilidades dos antigos mandatários e procurou reformar o exército, dando-lhe diretrizes e moral cristãs. Até então, o exército, esquecido de sua alta missão de mantenedor da paz, se havia envolvido em política, exercendo um contínuo despotismo.
         Aceitando o poder, Gabriel García Moreno fez compromisso pessoal de acabar com a fanfarrice dos militares. “Um exército constituído como o nosso – dizia ele – é um cancro que rói toda a nação; ou reformá-lo-ei ou destruí-lo-ei.”
           Tendo sabido que o General Ayarza, chefe dos militares descontentes, urdiu uma conspiração contra o Governo, levou-o ao quartel para açoitá-lo diante de todos, como se fosse um simples soldado.
           – Fuzilai-me! - gritava Ayarza – Não se açoita um general!
           – Não se desperdiça pólvora para fuzilar um traidor! – redarguiu Garcia Moreno
           O castigo foi severo, mas o fim alcançou-se. O exército entendeu que a era dos seus desmandos tinha passado e, com efeito, tornou a entrar na ordem.
            Fez vir, então, para o Equador os religiosos jesuítas e de outras ordens, entregando-lhes a educação, e o ensino da juventude equatoriana. Construiu estradas e intensificou as comunicações no país. Finalmente concluiu com a Santa Sé uma concordata das mais notáveis, por ser a mais cristã de todas as concordatas.

CONCÍLIO DE QUITO – DERROTA DE TULCÁN – EXPEDIÇÃO DE ZAMBELLI
 (1.862 – 1.863)

          Com a tranquilidade da qual a Igreja gozava, os bispos equatorianos puderam convocar o Concílio de Quito, sob a proteção de García Moreno e o Clero do país pôde ser reformado. Criaram-se três novas dioceses e seminários em todas as existentes.
          O sossego e a paz foram, no entanto, perturbados por um incidente com as tropas colombianas. García combateu essas tropas, mas foi derrotado em Tulcán. Mas a sua conduta foi tão nobre, que o general colombiano chamou-o de vencedor e concluiu com ele um tratado.
           Urbina tentou voltar ao poder a todo o custo. Havia inúmeras revoltas em Guayaquil e o Congresso fez tudo o que pôde para impedir o presidente de agir livremente. Gabriel García Moreno chegou a pedir a demissão do cargo, mas o Congresso não o deixou.
          Seguiu-se ainda uma guerra com a Colômbia, mas o Equador saiu vitorioso, mas não sem ter de condenar ao fuzilamento o General Maldonado, que havia traído as armas do Equador.
          Ocorreu mais um incidente com Urbina. As tropas urbinistas apoderaram-se de um navio à vapor inglês, o Washington, devido a um suborno de mil piastras orquestrado entre Urbina e o comandante do navio. Apoderado do navio à vapor, conseguiu usurpar também o Guayas, único navio de guerra do Equador, à custa da vida dos oficiais e marinheiros. Senhores do Guayas, dirigiram-se ao Bernardino, outro navio comerciante. Com estas três presas, refugiaram-se na enseada de Zambelli, a sete léguas de Guayaquil, enquanto os impotentes canhões da cidade anunciaram a perigosa tentativa de Urbina para retomar o poder.
          Três dias após estes fatos, Gabriel García Moreno, que, então, estava retirado a três léguas da capital para restabelecer a saúde seriamente comprometida, ficou inteirado de tudo. Em um instante tomou uma resolução e assentou o seu plano de campanha. Voltou à capital e sem comunicar o motivo, senão ao vice-presidente, Carvajal, dirigiu-se logo à Guayaquil, percorrendo em três dias as oitenta léguas que separam Quito desta cidade.
          O povo em Guayaquil estava sumamente agitado e não imaginava como o presidente venceria esta empresa sem navios nem meios de os comprar. Sua curiosidade foi logo satisfeita. Tendo entrado um navio inglês, o Talca, no porto de Guayaquil, Gabriel García Moreno, rapidamente negociou com o comandante a sua aquisição pelo Governo do Equador. Estava armado o plano: armar o navio mercante e só com ele investir contra os três navios urbinistas. Conservadores e liberais mostraram-se zelosos em ajudar o presidente, os primeiros por patriotismo e os segundos por crer que o presidente não sairia com vida desta empresa temerária.
           Reunindo os seus soldados, Gabriel García Moreno dirigiu-lhes estas palavras: “Não quero senão homens que tenham no peito coração de bravo; passem os valentes para a minha direita e os covardes para a esquerda!” Todos se colocaram à direita. Satisfeito, Gabriel García Moreno escolheu duzentos e cinquenta dentre os oficiais, e ordenou-lhes que embarcassem. Repassando algumas palavras de confiança em Deus e de ardente patriotismo, exaltou a coragem da pequena, mas heróica tropa. Eletrizados por aquelas nobres palavras, os soldados deixaram o porto ao grito de “Viva García Moreno!”
           Tinha à sua disposição o Smyrk, um pequeno navio à vapor que servia de explorador. Este reconheceu e comunicou a posição exata dos inimigos. O momento decisivo tinha chegado. O Guayas disparou seus canhões contra o Talca. Por mais que os soldados temessem, Gabriel García Moreno ordenou que nenhum disparo inútil fosse dado. “Punhal à mão!” – gritou o presidente e o Talca à todo o vapor se arremeteu em direção ao Guayas, e, chegando a uma distância conveniente, descarregou a sua artilharia. Por causa dos disparos, uma larga brecha se abriu no navio e o Talca pôde penetrar-lhe, cortando-o ao meio. Os revoltosos pereceram quase todos por causa do choque e os demais no mar, tentando fugir ou em luta direta com os soldados de Gabriel García Moreno. Capturado o Bernardino quase sem resistência, faltava alcançar o Washington, que estava quase na praia. Urbina e Robles, que haviam banqueteado a noite inteira, de tão estupefatos pelo soçobrar do Guayas, fugiram com toda a tripulação do Washington, refugiando-se nas matas do litoral. Quando o presidente aproximou-se, encontrou o navio completamente abandonado. Urbina e Robles tiveram tanta pressa em fugir que deixaram os tesouros, e suas correspondências sumamente comprometedoras. Três dias depois não ficou um só urbinista no Equador. Refugiaram-se todos na fronteira com o Peru, decididos a não atentar contra o Governo tão cedo.
          Os quarenta e cinco prisioneiros foram julgados pelo Conselho de Guerra, à bordo do Talca. Dezessete foram perdoados pelo presidente, que entendeu o terem sido forçados à traição. Os demais foram condenados ao fuzilamento, enquanto a esquadrilha voltava à Guayaquil. Gabriel García Moreno, que levara sacerdotes para a empresa audaciosa, quis que eles tivessem a chance de ter os seus pecados perdoados pela justiça divina, já que a justiça humana lhes fora menos clemente, porque não tinha a eternidade para se exercer. E assim, antes destes traidores da pátria serem fuzilados, muitos puderam receber a absolvição das mãos de um padre e encomendar a alma à Deus. O Smyrk foi adiante levar as novas da derrota de Urbina e, quando o povo o avistou, lastimou, crendo que trazia as novas da derrota de Gabriel García Moreno. Quando o povo, no entanto, avistou o presidente, entrou em frenesi. A entrada de Gabriel García Moreno em Quito foi um verdadeiro triunfo. O povo inteiro o proclamou herói do Equador, o homem da Providência, o domador da Hidra Revolucionária. Uma só nuvem encobria o sol daquele dia solene em que o povo festejava a sua libertação: Gabriel García Moreno em breve entregaria as rédeas do governo à outrem com o fim de seu mandato. O governo de um bom rei acaba rápido, mas o governo de um bom presidente acaba mais rápido ainda.

Continua ...

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